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Nova Lei de Licitações (Lei Federal nº 14.133/2021) e o Licenciamento Ambiental

Em 1º de abril de 2021 foi sancionada e publicada no Diário Oficial da União a Lei Federal nº 14.133/2021[1], considerada a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos.


Aguardada por muitos operadores do direito e especialistas em direito público como uma atualização e compilação das normas até então vigentes – em especial a da Lei nº 8.666/1993 – a nova Lei de Licitações trouxe consigo diversas novidades no campo das contratações públicas.


Apesar da ter sido sancionada, o Congresso Nacional ainda avaliará os 22 vetos presidenciais[2], e a a nova Lei de Licitações terá um prazo de dois anos para que sua aplicação seja exigida. Até lá, a Administração Pública poderá optar pela aplicação da nova Lei ou do regramento antigo.


Assim como toda norma recente, a nova Lei de Licitações agradou a alguns e desagradou a outros, que esperavam uma norma menos burocrática, e mais moderna. Há quem achei que “representa muito mais que um retrocesso[3] e que “a Lei nº 14.133/2021 é um excessivo texto legislativo que traz consigo heranças das legislações e jurisprudências até então vigentes, que na busca de avanços e soluções tornaram ainda mais burocrática e complexa a realidade da Administração Pública[4].


Independentemente das controvérsias desta norma, fato é que ela está aí, sancionada e vigente, e trazendo novidades e incorporações importantes em relação à temática ambiental. Isso mesmo, este artigo não irá recorrer às disposições gerais da nova Lei de Licitações, mas abordará aquelas específicas, relacionadas ao meio ambiente e ao licenciamento ambiental.


Inobstante aos esparsos acórdãos, precedentes, leis e orientações de órgãos de controle e do Poder Judiciário, muitos deles incorporados na nova Lei, se pode verificar que, em comparação à Lei nº 8.666/93, a preocupação ambiental nesta norma está patente e irá refletir sobremaneira nas contratações e no mercado profissional dos prestadores de serviço (consultores ambientais, advogados e profissionais afins).


Pessoalmente, ouso dizer que o texto da nova lei é “mais verde”.


De plano, numa rápida busca percebe-se que o termo “ambiental” é citado 650% mais na nova Lei nº 14.133/21, em comparação à Lei Federal 8.666/1993[5].Feita essa curiosa busca, nasceu a ideia desse artigo.


São as aparições “ambientais” na nova Lei de Licitações:


· No inciso XXV do artigo 6º:

Na definição do projeto básico manteve-se o previsto na lei anterior, como sendo o conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado para definir e dimensionar a obra ou o serviço, etc , considerando também como parte do projeto básico o tratamento do impacto ambiental do empreendimento.


Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se:[...]

XXV - projeto básico: conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado para definir e dimensionar a obra ou o serviço, ou o complexo de obras ou de serviços objeto da licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares, que assegure a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento e que possibilite a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução, devendo conter os seguintes elementos: [...]


A saber, impactos ambientais são as alterações no ambiente resultantes das atividades humanas.[6] O principal objetivo de uma avaliação adequada de impactos ambientais é – basicamente – evitar, reduzir, neutralizar ou compensar efeitos negativos do empreendimento sobre o meio ambiente.



· No parágrafo 5º, inciso I, do artigo 25:


Um dos aspectos inovadores, é a possibilidade do Edital de Licitação prever que o contratado para uma determinada obra ou serviço seja responsável pela obtenção do licenciamento ambiental[7].


Art. 25. O edital deverá conter o objeto da licitação e as regras relativas à convocação, ao julgamento, à habilitação, aos recursos e às penalidades da licitação, à fiscalização e à gestão do contrato, à entrega do objeto e às condições de pagamento. [...]

§ 5º O edital poderá prever a responsabilidade do contratado pela:

I - obtenção do licenciamento ambiental; [...]


Ou seja, poderá a Administração Pública contratar uma obra, por exemplo, e expressamente responsabilizar o contratado pela elaboração dos estudos e projetos necessários à obtenção da necessária Licença Ambiental[8].



· No parágrafo 6º do artigo 25:


Outro aspecto, inclusive bastante curioso e particularmente importante, é o fato de a nova Lei de Licitações estabelecer expressa prioridade de tramitação do licenciamento ambiental de obras e serviços de engenharia licitados e contratados.


§ 6º Os licenciamentos ambientais de obras e serviços de engenharia licitados e contratados nos termos desta Lei terão prioridade de tramitação nos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama) e deverão ser orientados pelos princípios da celeridade, da cooperação, da economicidade e da eficiência.


A prioridade de tramitação justifica-se pelo próprio interesse público que envolve todas as contratações do Poder Público.



· No parágrafo 1º do artigo 34:


Já previsto na Lei nº 12.462/2011[9], o menor impacto ambiental e ciclo de vida passa a integrar definitivamente critérios de julgamento na nova Lei de Licitações, e poderão ser considerados para a definição do menor dispêndio.


Art. 34. O julgamento por menor preço ou maior desconto e, quando couber, por técnica e preço considerará o menor dispêndio para a Administração, atendidos os parâmetros mínimos de qualidade definidos no edital de licitação.

§ 1º Os custos indiretos, relacionados com as despesas de manutenção, utilização, reposição, depreciação e impacto ambiental do objeto licitado, entre outros fatores vinculados ao seu ciclo de vida, poderão ser considerados para a definição do menor dispêndio, sempre que objetivamente mensuráveis, conforme disposto em regulamento. [...]



· No artigo 45:


Aqui, tal como já previa a Lei 13.303/2016[10], este dispositivo da nova Lei de Licitações traz a exigência de que as licitações de obras e serviços de engenharia respeitem aspectos ligados ao meio ambiente, especialmente, as normas relativas a:

I - disposição final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos gerados pelas obras contratadas;

II - mitigação por condicionantes e compensação ambiental, que serão definidas no procedimento de licenciamento ambiental;

III - utilização de produtos, de equipamentos e de serviços que, comprovadamente, favoreçam a redução do consumo de energia e de recursos naturais;

IV - avaliação de impacto de vizinhança, na forma da legislação urbanística;

V - proteção do patrimônio histórico, cultural, arqueológico e imaterial, inclusive por meio da avaliação do impacto direto ou indireto causado pelas obras contratadas;

VI - acessibilidade para pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. [...]



· No parágrafo 2º do artigo 124:


Enquanto a Lei nº 8.666/93 contém apenas previsão genérica acerca da possibilidade de repactuação para manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, se mostra bastante relevante o dispositivo da nova Lei de Licitações que prevê essa possibilidade. Nesse sentido, será viável a alteração nos contratos regidos pela nova Lei de Licitações, por acordo entre as partes, e para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro inicial, quando a execução for impedida em razão do atraso no licenciamento ambiental, desde que “por circunstâncias alheias ao contratado”.


Art. 124. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:

I - unilateralmente pela Administração:

II - por acordo entre as partes: [...]

d) para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe ou em decorrência de fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis, que inviabilizem a execução do contrato tal como pactuado, respeitada, em qualquer caso, a repartição objetiva de risco estabelecida no contrato. [...]

§ 2º Será aplicado o disposto na alínea “d” do inciso II do caput deste artigo às contratações de obras e serviços de engenharia, quando a execução for obstada pelo atraso na conclusão de procedimentos de desapropriação, desocupação, servidão administrativa ou licenciamento ambiental, por circunstâncias alheias ao contratado.


Desta forma, por exemplo, a contratação de uma obra pode ter seus termos alterados em decorrência do atraso na expedição da licença ambiental, de modo que nem a Administração Pública nem o contratado “percam” a efetividade do contrato e eventualmente os próprios recursos atrelados à contratação.



· No inciso VI do artigo 137:


Esse dispositivo trouxe novas hipóteses de extinção do contrato. A partir da nova Lei de Licitações, o atraso na obtenção da licença ambiental, ou a impossibilidade de obtê-la, ou até mesmo a alteração substancial da peça técnica de anteprojeto[11], podem constituir motivos para extinção do contrato. Sendo o caso, esse pedido de extinção deverá ser formalmente motivado nos autos do processo licitatório, assegurados o contraditório e a ampla defesa[12].


Art. 137. Constituirão motivos para extinção do contrato, a qual deverá ser formalmente motivada nos autos do processo, assegurados o contraditório e a ampla defesa, as seguintes situações: [...]

VI - atraso na obtenção da licença ambiental, ou impossibilidade de obtê-la, ou alteração substancial do anteprojeto que dela resultar, ainda que obtida no prazo previsto; [...]



· No parágrafo 2º do artigo 137:


Além da hipótese anterior, ao contratado é dado o direito à extinção do contrato quando houver atraso ou descumprimento das obrigações do Poder Público, relacionado ao licenciamento ambiental.


§ 2º O contratado terá direito à extinção do contrato nas seguintes hipóteses: [...]

V - não liberação pela Administração, nos prazos contratuais, de área, local ou objeto, para execução de obra, serviço ou fornecimento, e de fontes de materiais naturais especificadas no projeto, inclusive devido a atraso ou descumprimento das obrigações atribuídas pelo contrato à Administração relacionadas a desapropriação, a desocupação de áreas públicas ou a licenciamento ambiental.



· No caput do artigo 144:


Uma das regras que considero importante estar expressa na nova Lei de Licitações é a possibilidade de remuneração variável, oportunizando segurança jurídica para os chamados contratos de performance. Apesar de já fazer parte da Lei 13.303/2016[13], a Nova Lei de Licitações consignou a possibilidade de remuneração variável vinculada ao desempenho do contratado, com base em critérios de sustentabilidade ambiental. Ou seja, pode a Administração Pública atribuir parâmetros a serem atingidos pelo contratado, durante a execução do objeto, que irão impactar na remuneração do mesmo.


Art. 144. Na contratação de obras, fornecimentos e serviços, inclusive de engenharia, poderá ser estabelecida remuneração variável vinculada ao desempenho do contratado, com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazos de entrega definidos no edital de licitação e no contrato.



· No caput do artigo 147

Por fim, no capítulo que destaca as hipóteses de nulidade dos contratos, no caso de constada irregularidades no procedimento licitatório ou na execução contratual, não sendo possível corrigi-las, a decisão sobre a suspensão da execução ou sobre a declaração de nulidade do contrato deverá considerar, entre outros fatores, a motivação social e ambiental do contrato.


Art. 147. Constatada irregularidade no procedimento licitatório ou na execução contratual, caso não seja possível o saneamento, a decisão sobre a suspensão da execução ou sobre a declaração de nulidade do contrato somente será adotada na hipótese em que se revelar medida de interesse público, com avaliação, entre outros, dos seguintes aspectos:

I - impactos econômicos e financeiros decorrentes do atraso na fruição dos benefícios do objeto do contrato;

II - riscos sociais, ambientais e à segurança da população local decorrentes do atraso na fruição dos benefícios do objeto do contrato;

III - motivação social e ambiental do contrato;



Desta forma, por exemplo, a Administração Pública poderá dar continuidade à contratos, apesar de apresentarem falhas de ordem procedimental, quando sua paralisação ensejar em risco ambiental, ou prejuízo social e ambiental – maiores, portanto, que a falha identificada. Aqui, o espírito é não prejudicar o atendimento à população pela ausência de um serviço, obra ou material.




Por tudo que aqui foi exposto, sem querer dar juízo de valor quanto a oneração e burocratização (ou não) dos processos licitatórios e contratações públicas decorrentes da nova Lei de Licitações, resta evidente uma maior preocupação do legislador quanto a deixar explícita a relevância dos aspectos ambientais e seus impactos no âmbito das contratações da Administração Pública.


Seja para quem opera na área ambiental, tecnicamente ou juridicamente, dentro ou fora da Administração Pública, incorporar na Lei os aspectos ambientais, inclusive procedimental, são de extrema importância, pois demonstram a crescente importância que estes profissionais vem ganhando no mercado.


Com tamanha representatividade, é impossível discordar que a Administração Pública como um todo, deverá ser melhor assessorada quanto a matéria ambiental, assim como grande parte das empresas privadas, que prestam serviço aos entes públicos, e serão contratadas sob os critérios da Lei nº 14.133/2021.




 

Autor: Victor Valente Silvestre, Engenheiro Sanitarista e Ambiental graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Mestre em Engenharia Ambiental, também pela UFSC. Professor de Graduação e Pós Graduação.

 

[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14133.htm [2] De acordo com a Agência Senado, “os vetos serão analisados em sessão conjunta do Congresso Nacional, com data ainda a ser definida. Para a rejeição, é necessária a maioria absoluta dos votos dos parlamentares, ou seja, 257 deputados e 41 senadores, computados separadamente. Registrada uma quantidade inferior de votos pela rejeição em umas das Casas, o veto é mantido.” Fonte: https://www.irib.org.br/noticias/detalhes/nova-lei-de-licitacoes-e-publicada-com-vetos [3] É o que defendeu o presidente da Comissão de Infraestrutura da Câmara Brasileira da Industria da Construção (Coinfra/CBIC) e da Associação para o Progresso de Empresas de Obras de Infraestrutura Social e Logística (Apeop), Carlos Eduardo Lima Jorge, em entrevista dada à ‘Modal – Revista de Infraestrutura & Logística’. Fonte: https://abre.ai/nova-lei-de-licitacoes-representa-um-retrocesso [4] É o que defende o Advogado Alberto de Barros Lima, autor de diversas obras e reflexões sobre o tema. Fonte: https://abre.ai/licitacoes-e-contratos-administrativos-o-que-mudou-com-a-nova-lei [5] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm [6] A definição de “impacto ambiental” pela Resolução CONAMA 01/1986: “considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I - a saúde, a segurança e o bem-estar da população; II - as atividades sociais e econômicas; III - a biota; IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V - a qualidade dos recursos ambientais.” [7] A Resolução CONAMA nº 237/1997, em seu artigo 1º, inciso I, traz o conceito legal de licenciamento ambiental: “Licenciamento Ambiental: procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso”. [8] Licença Ambiental é o ato administrativo, emitido dentro do procedimento de Licenciamento Ambiental, através do qual o órgão ambiental competente autoriza a localização, instalação e operação de empreendimentos ou atividades licenciáveis (artigo 1º, inciso II, da Resolução CONAMA 237/1997). [9] LEI Nº 12.462, DE 4 DE AGOSTO DE 2011. Institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas - RDC; dentre outros. [10] LEI Nº 13.303, DE 30 DE JUNHO DE 2016. Dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13303.htm [11] Lei 14.113/2021. Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se: [...]. XXIV - anteprojeto: peça técnica com todos os subsídios necessários à elaboração do projeto básico, que deve conter, no mínimo, os seguintes elementos: [...]. [12] Em respeito ao artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal. [13] LEI Nº 13.303, DE 30 DE JUNHO DE 2016. Dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13303.htm






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